sexta-feira, 2 de abril de 2010

Um anjo sem asas

Havia um anjo sem asas no meu quarto. Suas asas caíram numa queda e eu as guardei. Pendurado na porta do armário, ele olhava
fixamente em direção à janela.
O que via este anjo? Olhava os passarinhos e deles sentia
inveja? Ouvia as andorinhas pousadas no parapeito
a descansar das revoadas em bando?
Não suportando sua angústia (ou minha?)
colei suas asas com superbonder. E perguntei:
e agora anjo?
Esperava um dia, tendo deixado a janela aberta,
me dar conta que o anjo ao ouvir o canto da sabiá,
e não podendo se conter tivesse se lançado ao céu.
E implorava:
Voe anjo,realize seu destino!

segunda-feira, 29 de março de 2010

Tá lá o corpo encolhido no chão

Congestionamento. Mas sábado à tardinha, congestionamento? Mudo meu caminho? Não, não deve ser nada! Estico o pescoço e lá na frente está livre. Posso esperar, paciência. Os carros, os ônibus, todos andando devagar. Carros de polícia...
No chão, encolhido, um corpo. Encolhida uma bicicleta. Um corpo no meu caminho no sábado à tardinha. Eu que estou indo à procura da poética.
Minhas lágrimas não consolarão nem a mim nem a ninguém.
O guarda apita, o trânsito anda.

"Oh! Minha estrela amiga. Porque você não fez a bala parar?"

Ainda estou sob o impacto da morte do cartunista Glauco: "Como pode acontecer, um simples canalha mata um rei em menos de um segundo" (música gravada Milton Nascimento feita pra homenagear John Lennon por Beto Guedes e Ronaldo Bastos)
Fico lembrando desta música, não me sai da cabeça. Tive que ir pesquisar e ouví-la pois servia perfeitamente pra homenagear o Glauco.
Eu leio o jornal todos os dias. O de papel, que suja as mãos, que eu posso levar pro banheiro, levar pra onde vou. Dobro e leio quando quero. Mas quando o tempo não deixa corro nos quadrinhos. Sempre gostei do Angeli, do Laerte, e do Glauco. Adoro o Faquinha, o cacique Jaraguá. Vou sentir tanta saudade!
A gente continua querendo Um Novo Mundo.

Sarau do galo só

Sarau do galo só



Um galo sozinho no meio da cidade canta.
Não tem outro galo que apanhe seu canto e o lance a outro.
Mas eu apanho este canto. Mas a quem vou lançá-lo?
E o galo perdido e só num quintal de cidade. Perdido, continua a lançar seu canto dia afora.
Nunca vi o galo, ele nunca me viu.
Mas eu, ser humano dotado de possibilidades reconheço sua existência através do canto.
Estou mais só do que o galo. Não consigo cantar.

Meu bairro, minha história


Meu bairro, minha história

João Mineiro,Dito carvoeiro, D. Joaquina, Raul (o bêbado), Silvio (pé de valsa) Paulo Bota e tantos outros.

Nasci em Jaraguá, filha de pai baiano e mãe do interior de São Paulo. Os dois se conheceram nos bailes da Parada de Taipas, no tempo que os cavalheiros usavam um lenço ao dar a mão à moça com quem iriam dançar.

A primeira casa de que me recordo foi perto da "bomba". A bomba era de gasolina e ficava perto do Isabel Vieira, o grupo escolar onde estudei até a quarta série.

Ao lado da escola morava meu avô, o saudoso Seu Cândido, que sentado na varanda enfeitada de primavera vermelha, cumprimentava a todos e a todos convidava pro cafezinho.

Jaraguá das minhas lembranças de criança era lindo. A primeira casa própria construída em mutirão com amigos do meu pai ficava próxima da linha do trem. Da varanda víamos os trens que chegavam e com o apito nos lembrava da hora. O chefe da estação era o pai do Panela, amigo de meu irmão. Eu gostava de ir na casa do chefe da estação, casa de madeira construída pelos ingleses. Ainda me lembro do som das pedras ao serem pisadas e do som da ponte de metal que ligava a linha férrea à casa. O morro ao lado da casa, que eu também avistava de casa, era coberto de quaresmeiras e manacás, isto antes da instalação da Voight.

Outro marco da lugar era a igreja católica, eternamente a ser terminada.

Na última vez em que estive no bairro, o viaduto sobre a bela estação de trem começava a dar mostras de que realmente seria construído mas pra isto era necessário derrubar casas e locais de comércio. Quando cheguei em casa, depois de uma estada de alguns dias na casa de minha tia, procurei a foto do local num endereço de mapa na internet pois eu sabia que uma parte da minha memória ia ser destruída na construção do viaduto. Queria guardar a foto da memória.

Nas minhas noites inquietas ainda me lembro do bairro do jeito que conheci. Me sinto menina e ouço o latido dos cachorros e o canto das cigarras no verão. Fico tranquila então e adormeço em Jaraguá mais uma vez.